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Internet, globalização e cultura

Renato M.E. Sabbatini

A Internet, a rede global de computadores que já tem mais de 60 milhões de usuários conectados em todo o mundo, está fazendo mais pela globalização da sociedade, da economia e da cultura do que todos os outros meios. Verdadeiro ou falso ?

Se pensarmos bem, o que está se chamando de globalização começou há muito tempo, e o veículo dessa transformação foi a indústria de comunicação, principalmente a de entretenimento. Duas descobertas tecnológicas revolucionárias (feitas pelo mesmo homem, Thomas Alva Edison !) foram os seus arautos: o telefone e o cinema. Mais tarde vieram o rádio e a televisão, mas não há dúvida que seu principal agente foi o cinema de Hollywood, que estendeu a todos os recantos do globo sua mensagem quase que evangelizadora do “american way of life”. O pragmatismo norte-americano logo soube aproveitar isso para a área econômica. Por exemplo: qual foi a primeira indústria realmente multinacional ? Foi a Coca-Cola Company, de Atlanta, Georgia... Quem fez todo mundo morrer de vontade de tomar uma coca-cola geladinha ? Os filmes do tempo da guerra ! Quem inventou o termo “glamour” e glamourizou o hábito de fumar, inclusive as mulheres ? De novo foi Hollywood. E assim por diante... Dizem alguns gurús da sociologia, até, que antes do cinema, boa parcela da humanidade não sabia que podia aspirar à felicidade, e que tinha o direito ao bem estar. As expectativas mudaram demais.

Outra coisa: um dos aspectos mais importantes da globalização é o surgimento de uma linguagem universal, no seu sentido mais amplo. O inglês (de novo, graças a Hollywood) firmou-se como essa linguagem, mas também a padronização das palavras e até dos conceitos sociais estão envolvidos. Da tendinha de um árabe nômade no Saara, ao apartamento ultramoderno de um yuppie brasileiro, existe hoje o “consciente coletivo”, para emprestar um termo de Carl Jung, o psicanalista suiço.

Pois bem, Internet. O que ela faz pela globalização ? Muitas coisas. Primeiro, ela está provocando um fenômeno absolutamente novo: a comunicação sem a marca da nacionalidade. Já pensaram bem nisso ? (você só entenderá bem se for um usuário da Internet...) Quando se vê uma home-page na WWW (a parte gráfica e multimídia da Internet) ou se lê uma mensagem de uma pessoa numa lista de discussão, o país e o idioma de quem as escreveu não são imediatamente aparentes, nem são importantes, na maioria das vezes. A comunicação por escrito é preponderante; e isso livra as pessoas de serem identificadas por seu sotaque, ou rotuladas por sua cor de pele, aspecto racial, etc. Qualquer coisa que ajude a derrubar as ancestrais barreiras tribais do gênero humano, construídas há centenas de milhares de anos e embutidas biologicamente nos nossos cérebros, facilita a globalização.

Na WWW, os “links” são o instrumento da democratização ! Explico: em uma página da WWW, você pode achar determinadas palavras grifadas ou imagens (ícones), como no Help do Windows, que são chamados de “links” ou vínculos. Ao “clicar” o mouse sobre eles, o computador vai buscar automaticamente um documento ou imagem, esteja onde estiverem, que pode ser em um computador em Timbuktu ou em Genebra. Isso é feito de forma totalmente transparente, ou seja, você não precisa saber, se não quiser, de onde está vindo essa informação, e quem a escreveu... Quer coisa mais globalizadora do que isso ?

Depois, é claro, tem o blá-blá-blá da globalização da economia. Como a rede Internet facilita as transações econômicas entre paises, o fluxo de capitais, a oferta de bens e serviços, etc., etc. Mas isso não me interessa tanto quanto o estabelecimento de uma base cultural realmente universal, porque sem ela, não haveria a globalização da economia (vide exemplo da Coca-Cola). Na indústria cultural, isso é bárbaro. Só para dar um exemplo, existe na Internet uma livraria virtual chamada amazon.com, que tem mais de um milhão de títulos de livros, que você pode pesquisar usando palavras- chave, e comprar com um simples clique do mouse. Onde está essa livraria ? Não interessa, pode estar em qualquer lugar, inclusive num fundo de garagem numa cidadezinha do interior de um país qualquer, mesmo porque ela não precisa ter estoque, é tudo “just-in-time”. Para ir às compras na Internet, basta um cartão de crédito internacional. É a economia global, plugada na cultura global, e vice-versa.

Este final de século promete ser muito interessante...


Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas,
Autor: Email: sabbatin@nib.unicamp.br
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