Indice de artigos



Descobrindo novo planetas

Renato Sabbatini

Existe pouca coisa mais excitante em ciência, atualmente, do que a avalanche de descobertas de novos planetas, fora do sistema solar. A tal ponto que uma revista norte-americana publicou recentemente uma pequena gozação com os astrônomos, dizendo que eles estavam se transformando em epicuristas, ou seja, seguidores da filosofia boa-vida do grego Epicuro. Não porque estejam fazendo mais festas ou bebendo mais champanhe, mas sim porque Epicuro acreditava que o Universo abriga um número essencialmente infinito de mundos iguais ao nosso.
Parece que ele tinha razão. Atualmente a contagem está em 67, e crescendo. Nenhum astrônomo duvida que nas próximas décadas serão descobertos centenas, e talvez milhares de novos planetas, à medida em que a tecnologia de descoberta se aprimore. A NASA e a Agência Espacial Européia pretendem lançar na próxima década vários observatórios orbitais, que possivelmente serão até capaz de visualizar de forma irrefutável, pela primeira vez, um planeta.

É quase um milagre científico que os cientistas consigam detectar a existência de um planeta de uma estrela distante. Evidentemente, não existem ainda métodos visuais de detectá-los, devido à distância, ao pequeno tamanho dos planetas, e ao fato de que não emitem luz própria. Assim, os astrônomos precisam se basear em medidas ultraprecisas da velocidade da estrela, realizadas ao longo de vários anos, em muitos casos.

O método é mais ou menos o seguinte: analisando a luz emitida por uma estrela, os astrônomos conseguem medir a sua velocidade de deslocamento. Isso é feito através do chamado "efeito Doppler": se uma fonte de luz se afaste do observador à uma certa velocidade, a freqüência da onda parece diminuir. Se, ao contrário, a fonte de luz se aproxima do observador, a freqüência da onda parece aumentar. Na prática, isso significa que a cor da luz da estrela fica mais avermelhada se ela está se afastando, e mais azulada, se ela está se aproximando na direação do observador.

Os cientistas logo notaram que existem variações regulares de velocidade em algumas estrelas, seguindo formatos muito peculiares. A única coisa que poderia causar essas variações seria a atração gravitacional minúscula, exercida por corpos sólidos orbitando ao redor da estrela. Medindo os intervalos entre essas variações permite aos cientistas calcular basicamente quatro coisas: a rapidez da rotação, a massa do planeta, a distância da estrela, e as características da órbita (elipsidade).

O estudo dos planetas extra-solares tem rendido informações interessantíssimas, e, em muitos casos, estão alterando de forma radical muitos conceitos que a astronomia tinha sobre os corpos planetários; a tal ponto que muitos astrônomos já estão se perguntando se nosso sistema solar seria uma raridade. De fato, até recentemente, todo mundo acreditava que as outras estrelas deveriam ter sistemas planetários muito semelhantes ao nosso: os planetas são estáveis, têm órbitas circulares e seguem uma lógica baseada na física: os planetas mais próximos ao sol são pequenos, rochosos e livres de atmosfera (Mercúrio, por exemplo), os intermediários têm tamanho médio, são rochosos e têm algum tipo de atmosfera (Vênus, Terra e Marte), e os mais distantes são essencialmente gasosos e gigantescos (Júpiter, Saturno e Netuno).

Ledo engano. A nova galeria de planetas extrasolares têm membros que variam dos bem-comportandos aos bizarros. Existem planetas que tem 14 vezes a massa de Júpiter, e estão mais pertos da estrela que orbitam, do que Mercúrio do Sol. Outros têm órbitas altamente elípticas, variando suas distância da estrela quase tanto quanto o tamanho do sistema solar. A maioria gira ao redor de sua estrela em velocidades assustadoras: um deles completa o seu "ano solar" em menos de três dias. Assim, ou ele está muito perto da estrela, ou gira muito depressa (ou ambos!). O menor planeta achado até hoje é do tamanho aproximado de Júpiter, e gira em torno de uma estrela muito parecida com o Sol. Também foi achado um planeta que orbita a uma distância quase igual à da Terra, o que levanta a possibilidade de abrigar formas de vida.

O interessante é que os planetas mais distantes da Terra em nosso sistema solar foram "descobertos" por um método semelhante, antes que fossem observados visualmente, o que coloca dúvidas sobre quem teriam sido seus descobridores. Até o 1781, os cientistas conheciam apenas seis planetas, incluindo a Terra. Naquele ano, o astrônomo britânico Sir William Herschel descobriu, por observação direta, o planeta Urano. Os planetas Netuno e Plutão, no entanto, tiveram sua existência predita a partir da observação de irregularidades na órbita de Urano, que só poderiam ser causados por forças gravitacionais de corpos sólidos na sua proximidade. Assim, o britânico John Couch Adams e o francês Urbain-Jean-Joseph Le Verrier in France, calcularam a posição de Netuno, e os astrônomos James Challis e Johann Galle, independentemente, em 1834, conseguiram localizá-lo. Plutão foi predito pelo americano Percival Lowwell, e visualizado em 1930 no Lowell Observatory, no estado do Arizona, pelo astrônomo Clyde Tombaugh, em 1930.

Tudo isso é muito excitante para a astronomia, e a grande pergunta é se um dia seremos capazes de visualizar esses planetas, ou até de determinar evidências indiretas de que eles abrigam vida semelhante à nossa. Nesse dia, nossa concepção sobre nós mesmos e sobre o destino da humanidade sofrerá uma mudança irreversível.
 


Correio PopularPublicado em: Jornal Correio Popular, Campinas,  .

 Autor: Email: renato@sabbatini.com

WWW: http://renato.sabbatini.com
Jornal: Email: cpopular@cpopular.com.br
WWW: http://www.cosmo.com.br

Copyright © 2000 Correio Popular, Campinas, Brazil