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O futuro da microeletrônica

 

Renato Sabbatini

A mágica dos processos de microfabricação baseado em chips de silício é que a cada geração de microprocessadores as dimensões dos componentes ficam menores, os circuitos ficam mais complexos e o custo de produção fica mais barato por bit. Esses processos constituem a base da revolução da microeletrônica e da informática que afetou todos os aspectos das sociedades humanas nas décadas finais deste século.

Atualmente a Intel (http://www.intel.com) , a empresa que mais inova no mundo (e deste modo continua na dianteira industrial e comercial), utiliza processos de microfabricação capazes de produzir fios elétricos no chip com apenas 0.18 a 0.25 milésimos de milímetro (micrômetros, ou micra). Os chips Intel Celeron e Pentium II utilizam a tecnologia de 0.25 micra, e um novo chip para computadores portáteis utiliza a de 0.18 micra. Para se ter uma idéia do que representa 0.18 micra, imagine que esse é aproximadamente o diâmetro de uma célula sangüínea! Esses processos não são curiosidade de laboratório: a Intel já os está utilizando para produção de massa.

Quais são as conseqüências de fabricar circuitos integrados com fios e componentes cada vez menores? Uma delas é o consumo menor de energia (por isso que o chip de 0.18 micra foi direcionado primeiro para o mercado de laptops e palmtops, PDAs, etc.). Outra é a área menor total ocupada pelo chip (fator de forma), também uma boa coisa. Mas a mais importante é o aumento de velocidade de processamento, pois os elétrons precisam "andar" menos para ir de um lado para o outro do chip. Essa não é a única razão do aumento constante da velocidade dos microprocessadores, é claro: mudanças na arquitetura e nas técnicas de processamento são as principais. Mas, com tudo isso, já temos chips de 500 MHz (500 milhões de comandos processados por segundo) em produção, e o ano que vem a Intel inicia a produção dos chips de 600 MHz. Em laboratório, entretanto, a empresa demonstrou em janeiro ter quebrado a importantíssima barreira de 1 GHz (um bilhão de operações por segundo), o que é simplesmente espantoso, se soubermos que há apenas cinco anos atrás a mesma Intel tinha anunciado com orgulho ter rompido a barreira dos 100 MHz, ou seja, 10 vezes menos!

Mas o progresso não para por aí. As atuais tecnologias de fabricação utilizadas pelo indústria microeletrônica permitirão um fator de encolhimento de até 3 vezes em relação aos atuais, chegado aos processos de 0.08 a 0.10 micra. Para o leitor entender a razão desse limite, é preciso explicar como os chips são feitos. Inicialmente, o circuito completo, com todos os transistores, resistores, capacitores, fios elétricos de interconexão, etc., são projetados e desenhados por computador em uma matriz enorme, de alguns metros de comprimento. Essa matriz (ou mais precisamente, diversas matrizes, pois atualmente os chips são construídos em até cinco camadas superpostas de componentes e de fios) é fotografada e depois reduzida algumas milhares de vezes, como se fosse projetada através de um microscópio ao contrário. A luz projetada é usada para marcar sobre um chip de silício ultrafino as áreas em que devem ser depositados semicondutores, fios, e assim por diante. A extraordinária redução de tamanho obtida por essa técnica (que é chamada de fotolitográfica) só é possível atualmente usando-se luz ultravioleta (DUVL: Ultraviolet Lithography), pois ela tem o comprimento de onda menor do que a luz visível. Para as técnicas fotolitográficas do próximo século será utilizada uma luz ultravioleta ainda mais profunda (EUVL: Extreme Ultraviolet Lithography). A técnica DUVL consegue imprimir fios de até 100 nanometros (0,1 micra), mas esse comprimento tem muitos problemas para produção em massa. As técnicas EUVL chegarão até os 50 nanometros (0,05 micra)

Outros fenômenos limitarão o escala crescente de microminiaturização. A tecnologia de semicondutores utiliza atualmente, chamada de CMOS (Complementary Metal Oxide Semiconductor) começa a apresentar sérios problemas a partir de 0.1 micra, tais como aumento da resistência elétrica, correntes de vazamento, e efeitos de túnel de corrente (a distância entre dois fios adjacentes é tão pequena, que o isolamento elétrico entre eles não consegue impedir que os elétrons "saltem" de um fio para outro, causando curtos-circuitos freqüentes). Outros materiais terão que ser usados além do silício e do alumínio. A Intel já utiliza cobre em seus fios, no lugar do alumínio, mas o óxido de silício, que é o isolante elétrico básico, não funcionará mais.

Os fabricantes de microeletrônica enfrentarão desafios difíceis no próximo milênio. Gordon Moore, um dos fundadores da Intel, enunciou há várias décadas atrás o que é conhecido como "Lei de Moore": a complexidade e capacidade dos chips dobra de tamanho a cada nova geração tecnológica, a cada 18 meses, aproximadamente. Ela tem se comprovado verdadeira nos últimos 30 anos, pelo menos, e parece que vai continuar valendo para duas ou três gerações mais. Para a lei de Moore ser válida, os pesquisadores tiveram que aumentar fantasticamente o número de transistores por chip, diminuir o tamanho de cada elemento no chip e aumentar a área total ocupada pelo chip. Ao mesmo tempo, o custo por bit diminuiu centenas de milhares de vezes ao longo desses 30 anos, levando à revolução que mencionamos acima.

O custo de manter essa progressão é altíssimo. Estima-se, por exemplo, que uma fábrica para tecnologias sub-0.1 micra custará 20 bilhões de dólares! Esse custo é regulado pela chamada Segunda Lei de Moore, que diz que ele aumenta em uma escala semilogarítmica (ou seja, aumenta de 10 vezes a cada geração tecnológica de chips). É fácil ver que se o custo aumenta 10 vezes para aumentar 2 vezes a capacidade do chip, chegará um momento em que a produção ficará antieconômica: não haverá mercado para chips tão caros, produzidos em massa. É possível reduzir os custos através de logística, gestão de estoques, melhor design das fábricas, gestão do processo de invenção e acúmulo do conhecimento, etc., mas sem um impacto muito grande. Com esse objetivo, a Intel financia um milionário programa de pesquisas no MIT (Massachusetts Institute of Technology, www.mit.edu) chamado "Next Generation Manufacturing" (NGM).

Onde chegaremos nos próximos 10 anos? Se a indústria conseguir manter a Lei de Moore funcionando, é fácil predizer: os microprocessadores funcionarão entre 16 a 32 GHz, as memórias terão capacidade de 1,5 a 3 Gbits por chip, etc. Tudo isso pelo mesmo preço dos chips atuais…
 

Para Saber Mais

Intel Technology Journal: http://developer.intel.com/technology/itj/q31998.htm



Renato M.E. Sabbatini é professor e diretor do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo. Email: sabbatin@nib.unicamp.br

Veja também: Índice de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no Correio Popular.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 26/6/99.
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