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Computadores, Cérebro e Música

Renato Sabbatini

O cérebro é o nosso "computador biológico". Na realidade, ele é um conjunto complexissimo de milhões de computadores trabalhando em paralelo, cada um se encarregando de uma coisa. Se não fosse assim, seria impossível a vida ! Ao mesmo tempo que temos um "computador" em nossa cabeça cuidando da nossa pressão arterial, há um outro que regula a atividade de nossos músculos que controlam a postura, outro que cuida para que respiremos adequadamente, e assim por diante. Muitos desses "computadores" se comunicam constantemente entre si, com a finalidade de coordenar suas atividades. Por exemplo: o "computador" da respiração recebe dados do "computador" da pressão arterial, e ambos recebem dados dos "computadores" que controlam o comportamento emocional.

Possivelmente a atividade mais complexa do cérebro (e única entre todos os animais) é a de um músico que interpreta uma partitura. Ele, ao mesmo tempo, tem que ler e decodificar a complexa seqüência de símbolos musicais de uma partitura, recorrer à sua memória para saber como acionar o teclado e o pedal do piano, e conseguir o resultado apropriado em termos de tonalidade, duração, etc. O sistema motor do cérebro aciona os dedos e o braço, e o sistema auditivo monitora o resultado, informando aos demais centros se alguma coisa está errada. Fico atônito de admiração quando ouço concertistas tocarem uma sonada de Rachmaninoff inteiramente de memória: são centenas de milhares de detalhes que tem que ser relembrados perfeitamente, sem erro, na seqüência exata, em poucos minutos. É um show de desempenho do nosso maravilhoso computador cerebral.

A informática, ou seja, os computadores artificiais, tem ajudado muito os cientistas a entender como funciona o nosso "computador natural". Por exemplo, foram desenvolvidos equipamentos, como a tomografia de ressonância magnética funcional (fMRI) e a tomografia PET (Positron Emission Tomography), que permitem tirar "retratos instantâneos" da atividade do cérebro em várias situações, usando complexos programas de computador. As imagens aparecem em várias cores, como em um arco-íris. Regiões do cérebro pintados pelo computador na tela com tonalidade vermelha, amarela e branca, estão mostrando alta atividade funcional.

Nos últimos cinco anos foram publicados vários trabalhos científicos, notadamente pelos pesquisadores Peter Fox e Juliane Sergent, mostrando como se dá a atividade cerebral quando um músico está executando uma música. Foi possível identificar claramente como se dá a ativação do cérebro quando um músico lê, interpreta e toca uma música registrada em uma partitura. Ambos pesquisadores demonstraram que cada fase da execução musical ocorre em uma parte diferente do cérebro, e que existe uma espécie de "rede neural distribuida" que se encarrega de propagar os dados de um centro cerebral para outro. Fica assim demonstrado o conceito de que o nosso cérebro não é um computador, mas sim uma confedereação de computadores cooperantes, ou uma "sociedade da mente", como o denominou o pesquisador do MIT, Prof. Marvin Minsky. É um exemplo fantástico de pesquisa interdisciplinar em ciência, e de como a informática está sendo fundamental nos novos estudos sobre o cérebro e o comportamento. Se tiver interesse, visite http://www.bic.mni.mcgill.ca/ e http://imr.utsa.edu/petpiano.htm. Para ler uma entrevista que realizei com o Prof. Minsky sobre estes e outros temas, veja a revista on-line "Cérebro & Mente" da UNICAMP (http://www.epub.org.br/cm), em seu último número.
 

Para Saber Mais


Sabbatini, RME - Tomografia PET: Uma Janela para o Cérebro. Revista Cérebro & Mente 1(1), 1997.
 


Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 06/10/98.

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