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Televisão Interativa ou Computador?

 

Renato Sabbatini


Demorou, mas parece que está chegando. Os especialistas estão anunciando que a TV interativa está praticamente às nossas portas, e o arauto dessa impactante mudança é o acesso à Internet via TV a cabo. O motivo é simples: a convergência das duas tecnologias, Internet e TV, começou a ocorrer agora, a partir da maior disponibilidade do acesso digital bidirecional de alta velocidade (banda larga, no jargão dos técnicos). No Brasil, desde o ano passado está disponível o serviço Ajato, da TVA (operadora de TV a cabo de São Paulo), e, a partir de janeiro, no Rio e em São Paulo, o Virtua, serviço bidirecional da Net, a operadora líder de mercado, de propriedade da Globo Cabo.

TV interativa não é um conceito novo, diversas tecnologias para implementá-la existem desde o início da década dos 80s. Em muitos países europeus, começou com o videotexto e o teletexto, que conseguiram fazer convergir três tecnologias de forma barata e amplamente disponível: a linha telefônica, a TV e as redes de computadores. Até hoje, na França e na Inglaterra são muito usados, inclusive para o comércio eletrônico (no ano passado, cerca de 40% das passagens aéreas foram compradas através desses sistemas. Nos EUA e no Brasil, por vários motivos, não "pegaram". Um deles é que videotexto não é bem TV interativa: é apenas o uso do aparelho de TV como monitor (e de resolução bem ruinzinha, por sinal).

Outro sistema que surgiu uns três anos atrás foi a WebTV, uma tecnologia que permite navegar na Internet, enviar correio eletrônico, etc., através de um aparelhinho (um computador com um controle remoto um pouco mais complexo que o de uma TV normal) que se coloca ao lado do receptor. Novamente, não é TV interativa, pois não integra as duas mídias: ou você assiste programas normais de TV, ou usa o aparelho para acessar a Internet. A conexão, como no caso do videotexto, ocorre via linha telefônica. Não deu muito certo: embora tenha sido comprada pela Microsoft, em um investimento multimilionário, a WebTV está "apenas" em um milhão de lares americanos e não é muito usada (em comparação, a Internet está presente em 20 milhões de lares.)

E o que é então a "verdadeira" TV interativa. É a tecnologia que integra o acesso à Internet e a recepção de sinais de vídeo. Para explicar melhor, vou dar um exemplo: você está refastelado em sua poltrona, controle remoto nas mãos, assistindo à transmissão de um jogo de futebol entre o Palmeiras e o São Paulo. De repente, o Palmeiras marca um gol, e aparece um ícone do time num canto inferior da tela. Você pressiona um botão no controle remoto, ativando um cursor na tela, e você o desloca até o ícone, pressionando outro botão. Trata-se, como se pode perceber, de um misto de controle remoto e mouse sem fio. Imediatamente aparece uma tela menor, com o "site" do time na Web, contendo informações em tempo real sobre o jogo: quem marcou o gol, a sua ficha desportiva completa, etc. Dali, você pode sair navegando no "browser" para onde quiser, enviar um e-mail para seu amigo sãopaulino, gozando-o, etc. Ou então, poderá clicar no anúncio da Pizza Hut e encomendar pela Internet uma boa pizza, que chegará em sua casa em 20 minutos.

Toda essa "mágica" será feita por uma interface combinada Internet/TV a cabo, no mesmo aparelho, que permite dispensar a linha telefônica totalmente. Na realidade, alguns aplicativos já existentes, como o Net2Phone e o RealAudio, podem utilizar o mesmo cabo para fazer telefonemas e escutar canais de rádio de todo o mundo, através do protocolo IP (Internet Protocol) habilitado por esse aparelho. Votações eletrônicas, em coisas como "Você Decide", ou campanhas de doação via TV ficarão brincadeira de criança, literalmente (e aí é que está o perigo…)

Não existem limites para a TV interativa. Calcula-se que esse mercado movimentará nos EUA mais de 20 bilhões de dólares até 2003, e que poderá ser usado por mais de 80% da população americana. Funções simplificadas, como as que eu citei no exemplo, tornarão a experiência de acessar a Internet uma coisa tão transparente para o usuário comum, que ele nem perceberá que está fazendo isso. Segundo um executivo do ramo, será o sonho dourado tornado realidade para as empresas emissoras de TV: elas conhecerão o seu público de forma total (imaginem o que se pode medir em termos de audiência, como o IBOPE faz hoje através de amostragem em poucas residências), e poderão ter acesso direto e constante a ele. Para as agências de publicidade, então, será literalmente o paraíso. Agreguem a isso a capacidade de personalização da Internet, e teremos a possibilidade de ter "canais sintéticos", gerados a partir das preferências televisivas de cada um.

Os dois maiores gigantes dessa convergência, a America On-Line/Time Warner (recentemente fundidas) e a Microsoft, já estão se posicionando para uma batalha que não terá igual na história da comunicação de massa. Com a TV interativa, a Internet finalmente se transformará numa coisa tão conhecida e utilizada como o "broadcasting" de TV, hoje.
 

Para Saber Mais


Sabbatini, R.M.E.: Tecnologias convergentes. Correio Popular, Caderno de Informática. http://www.epub.org.br/correio/converg.htm

Sabbatini, R.M.E.: Rádio e TV Internet. Correio Popular, Caderno de Informática, 12/8/97. http://www.epub.org.br/correio/cp970812.html

Sabbatini, R.M.E.: WebTV, um casamento imperfeito ? Correio Popular, Caderno de Informática, 07/10/97. http://www.epub.org.br/correio/cp971007.html

Sabbatini, R.M.E.: Banda larga: a Internet à toda. Correio Popular, Cosmo, 2/7/99. http://www.epub.org.br/correio/cp990702.htm

Sabbatini, R.M.E.: A grande fusão. Correio Popular, Caderno Cosmo, 14/1/2000. http://www.epub.org.br/correio/cp000114.html



Renato M.E. Sabbatini é professor e diretor associado do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo. Email: sabbatin@nib.unicamp.br

Veja também: Índice de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no Correio Popular.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 25/2/2000 .
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