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Nanomecanismos

Renato M.E. Sabbatini

Debaixo de um poderoso microscópio, o engenheiro, observa, fascinado, a rotação de um motor elétrico. Zunindo à velocidade de 30.000 rotações por minuto, parece funcionar muito bem. A diferença em relação aos motores comuns, entretanto, é seu tamanho: dez destes minúsculos engenhos cabem folgadamente na cabeça de um alfinete. Em outros laboratórios, conseguiu-se construir pequenos dispositivos móveis, tais como membranas, relés, solenóides, catracas e engrenagens, alguns tão pequenos quanto um ponto impresso nesta página.

Esse espantoso processo de miniaturização mecânica, que promete revolucionar muitos setores da sociedade, é chamado de nanofabricação, e surgiu a cerca de 10 anos atrás, nos Estados Unidos. A técnica de fabricação dessas estruturas microscópicas é semelhante à utilizada para construir os modernos circuitos integrados, ou chips, que estão no coração de todos os computadores e calculadoras, e em milhares de outros tipos de aparelhos eletrodomésticos. Uma lâmina ultrafina de silício puro é escavada e moldada através de agentes químicos corrosivos e da deposição de filmes de alumínio. Para conseguir a miniaturização, um desenho das estruturas é reduzido fotograficamente centenas de vezes e utilizado como uma espécie de máscara que guia o efeito e o local dos agentes construtivos.

Uma das aplicações mais divulgadas (e fantásticas) dos nanomecanismos seria a construção de micro-robôs controlados eletrônicamente, que poderiam ser utilizados para realizar tarefas em lugares inacessíveis, tais como no exterior de uma nave espacial, ou no interior do corpo humano (fala-se, até, de micro-robôs cirurgiões, como aquele submarino do filme "Viagem Fantástica", que é miniaturizado e introduzido na veia de um paciente com câncer do cérebro). Aplicações como essas ainda estão razoavelmente distantes no futuro, mas os nanomecanismos já encontraram uso na construção de detectores ultraminiaturizados (como um sensor de pressão arterial que pode ser implantado permanentemente para monitorizar um paciente), e alguns deles já estão sendo vendidos comercialmente. É fácil prever que os órgãos artificiais inteligentes do futuro serão dotados de centenas de sensores e atuadores nanofabricados.

As nações desenvolvidas já acordaram para o potencial dos nanomecanismos, e começaram a investir pesadamente no setor. A maioria delas estabeleceu centros de pesquisa pura e aplicada dedicados à nanofabricação, como o National Nanofabrication Facility, na Universidade de Cornell. Uma das motivações por trás de todo esse esforço, aliás, é o seu potencial para as aplicações militares. Em um famoso conto de ficção científica, hordas de milhares de micro-robôs são lançados contra uma fortaleza metálica. Cada robô libera, ao se auto-destruir, uma pequena quantidade de calor. O resultado do impacto acumulado é o aumento da temperatura interna da fortaleza para mais de 100 graus, "fritando" todos os habitantes no seu interior. Com um preço muito baixo por robô, coisas como essa serão viáveis.

E o Brasil ? Infelizmente ainda não acordou para essa área. Não conheço nenhum grupo brasileiro significativo trabalhando em nanofabricação, ou qualquer programa estratégico do governo. Como parece que esta será mais uma das indústrias de grande impacto no futuro, pois afetará todas as que dependem da mecânica fina, como a de máquinas fotográficas, vídeo, automóveis, periféricos de computadores, aeronáutica e espacial, química, biomédica, etc.; convém começarmos a fazer alguma coisa a respeito, e logo...


Publicado em: Jornal Correio Popular, 4/11/93, Campinas
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